MARX e A FEB






Em 5 de maio de 1818 nasceu Karl Marx, em Trier, três anos depois de a cidade deixar de ser francesa e se tornar prussiana. Seu avô era judeu, rabino, cujo filho Heinrich se converteu ao luteranismo para livrar-se da discriminação e ter mais chance como advogado.

Pode ter dado certo, pois o filho Karl se casou com uma moça nobre e tiveram sete filhos. Desses, apenas três chegaram à idade adulta; Marx nunca foi apegado ao dinheiro e a família viveu a maior parte do tempo na penúria. As coisas só melhoraram depois que a mulher recebeu uma herança e ele um estipêndio de Friedrich Engels, seu grande amigo e admirador.

Marx fumava demais, tinha bronquite e pleurisia. Morreu quinze meses após a esposa. Diante de seu túmulo, Engels lamentou que o “maior pensador vivo” tivesse parado de pensar e contou: “nós o deixamos sozinho por dois minutos e quando voltamos o encontramos na sua poltrona, em paz, adormecido, para sempre”.

Engels não foi o único a se referir ao amigo como dono de um intelecto incomparável: cem anos depois, um levantamento mundial mostrou que Marx tinha sido não apenas o maior pensador de sua época, mas também do o milênio. Não foi apenas pai do marxismo, mas da arte de inventar o futuro. Seu pensamento é um pensamento crítico, contrário do dogmatismo. Ele não teve a pretensão de trazer verdades absolutas, eternas. Ao contrário, sempre acentuou os limites históricos das leis que descobriu. O pensamento vivo de Marx não é peça de museu nem ícone, mas um apelo à criação.

Marx criou novos conceitos sobre a sociedade e suas diferenças, a começar pelas diferenças entre a sociedade moderna, capitalista, burguesa e democrática, e todas as demais. Antes dele pensava-se que a realidade social não muda basicamente, que é uma conjunção de elementos que, sem grandes alterações, se projetam ao longo do tempo e do espaço.

Nicolau Machiavelli (1469-1527), por exemplo, e grande parte dos intelectuais que vieram depois dele (até mesmo hoje em dia), achava que a vida em sociedade nada mais é que um conjunto “completo em si mesmo” formado de convenções e de regras, um “jogo” que condiciona o comportamento dos participantes, restringe os objetivos e a natureza das ações.

Para Marx é diferente: a sociedade, em cada fase do seu desenvolvimento tem a sua própria história, suas características únicas, originais; é uma entidade pulsante cujos atores ‘fazem a diferença’. Esses atores, contudo, por força da rotina raramente têm consciência do “palco” em que atuam, pouca ou nenhuma noção acerca das circunstâncias em que desempenham seus papéis.

Por exemplo, na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) o Brasil cumpriu um papel importante que seus próprios soldados e comandantes militares jamais souberam ao certo qual foi. Nossas tropas, no entanto, executaram tão bem as suas missões que ao final da guerra os principais generais estrangeiros queriam que ficassem: um deles, chefe supremo das forças aliadas na Itália, chegou a dizer que “soldados tão bons como os brasileiros deveriam continuar na Europa e não voltar para casa”.

Nossos oficiais superiores pensavam diferente. Um deles, coronel Humberto Castello Branco, chefe de operações da FEB, Força Expedicionária Brasileira, estava com pressa de ir embora porque achava que o “Brasil não tinha interesse político na Europa”. Além disso, julgando-se um consumado estrategista, acreditava que tão logo os aliados se retirassem a Itália, por exemplo, “pegaria fogo e o nazifascismo ressurgiria das cinzas”. 

Sua esposa, no entanto, confidenciou que as diferenças de Castello eram mesmo de caráter pessoal, estava “saturado com tudo isto aqui” e bem seguro que “o momento certo de voltar é agora”. 

Essa dificuldade dos oficiais brasileiros de avaliar a complexa situação em que se encontravam refletia o que Marx denominava imperfeita consciência de si mesmo, que os fazia perder de vista a época, o mundo e a sociedade em que viviam. 

Noção cunhada antes de Marx por um filósofo alemão, Hegel (1770-1831), que interpretava a realidade social como uma conjunção de eventos humanos e naturais resultante da nossa capacidade inerente de sermos livres, de agirmos segundo a nossa consciência, por determinação própria, porém restritos por nossos anseios, interesses e necessidades.

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